terça-feira, 27 de julho de 2010

Férias com Crianças [Episódio II: Realidade]

Quem leu o nosso Episódio I já tem idéia de como eu acordei feliz no segundo dia da nossa epopéia.
Mas o dia começou tranquilo. Principalmente para o besouro, que não teve seu eterno descanso importunado.
Enquanto caminhávamos para o prédio principal para tomar o café da manhã, avaliava que a distância entre as duas construções parecia ser bem superior aos 50 metros descritos pela simpática atendente na reserva. Mas o dia estava tão bonito que Poliana poderia dizer que era um privilégio poder caminhar duas ou três vezes mais, sentindo o sol e ouvindo os pássaros.
E de fato o dia seguia tranquilo, com as crianças se divertindo da melhor forma possível, ao ar livre e se movimentando bastante com a eficiente orientação dos monitores Batatinha e Espeto. Até que no meio da tarde os dois se retiram para uma reparadora (e justa) pausa e... Não voltam mais. A programação das crianças previa um lanche da tarde com os "tios", que foi servido, mas teve que ser suportado pelos pais para evitar maiores frustrações aos pequenos. Minha mulher procurou a recepção para saber o que acontecia e foi informada de que os monitores viriam para o lanche com as crianças e estariam apenas atrasados. Naquele exato momento, a dupla vinha passando, malas em punho, dirigindo-se à saída. E a inquisitora não contém o comentário de quão estranho é o hábito dos monitores de andarem por aí carregando suas malas. Seria uma variante de TOC?
Procuro esclarecimentos com o gerente, que me garante taxativamente que os itens seguintes da programação estariam mantidos, já que a substituição dos monitores era esperada e houve apenas uma pequena falha na elaboração da escala, mas os substitutos estariam no hotel em menos de uma hora.
Enfim o cenário não parecia ruim. Ocorre que, na hora do jantar, todas as crianças se dirigem ao restaurante principal ávidas pelo jantar com os tios bagunceiros. E a mesa das crianças não contém tios, mas cerca de 20 crianças com cara de decepção ao redor. Algumas (incluindo minha caçulinha) fazem beicinho prenunciando choro. E isso, definitivamente, me tira do sério.
Procuro o gerente novamente. O infeliz ainda leva vários minutos para me atender, o que eleva meu coeficiente de ira.
Ele chega cortês. Excessivamente, para o meu momento. E antes que ele tenha a chance de me dar qualquer desculpa, passo-lhe uma descompostura sem precedentes, pois estava evidente que ele havia mentido descaradamente, horas antes. E a cada "veja bem" de lá, vinha nova descompostura de cá.
Depois de 20 minutos, minha opinião sobre sua sua incompetência já era pública e combinamos que se o dia seguinte não começasse com a ordem devidamente restabelecida, iríamos embora.
Jantei mal, brinquei um pouco com as crianças e fui dormir, não sem notar o besourinho imóvel, posto que morto, à minha porta.
Demoro para dormir. Além de nervoso, o povo das firma em convenção fala alto de novo. Reclamo de novo. De novo, não resolve. E de novo o cansaço me abate.
De manhã, a dor no pescoço persiste e a pulga que estava atrás da orelha atinge minhas partes mais íntimas. Só o besouro continuava intacto.
Mas o dia começa bem. Quatro recreadores simpáticos, alegres e com uniforme de trupe circense tomam café da manhã com as crianças, que se divertem desde o primeiro instante. Depois vão para um belo gramado, onde uma enorme cama elástica e um tatame já estão preparados para receber as crianças com competentes atividades de recreação e aulas de acrobacia. Minhas pequenas gurias se esbaldam até a exaustão.
Enquanto elas se divertem, não contenho a indignação com os acontecimentos anteriores. Reúno os outros 50% do capital votante do nosso board doméstico e decidimos deixar o hotel. Pelo celular, reservamos um outro hotel próximo, que seria um porto seguro.
Mas quando, perto da hora do almoço, resolvemos contar a novidade para as crianças... berreiro geral! Não adiantava enaltecer os milhões de atrativos do outro hotel. O quarteto fantástico tinha conquistado as meninas de forma arrebatadora. 
Em nova reunião do board, decidiu-se por voltar atrás e ficar. Pelo menos por enquanto. O fim de semana estava seriamente comprometido para nós dois e arrastar as crianças na marra não seria uma opção razoável.
A caminho do almoço, encontro o gerente que, com seu sorriso plastificado, pergunta se estou mais calmo. Respondo secamente que não e quem conhece meu timbre de voz sabe o que isso significa. E digo a ele que agradeça e trate muito bem dos seus monitores-artistas-circenses, porque graças a eles estávamos dando mais uma chance ao hotel.
A tal feijoada nos aguardava. 
Em teoria. 
Já fui office-boy e vendedor pelo centrão de São Paulo e já comi muita feijoada de boteco por aí, mas nunca vi uma que sofresse de tamanha crise de identidade. Ou minha ignorância me priva do saber de que qualquer coisa à base de feijão preto pode ser chamada de feijoada?
Mas tínhamos decidido que dali em diante iríamos nos divertir com essa trapalhada toda e aproveitar o ar puro e o silêncio que reinaria com o término da convenção de hunos.
E durante a tarde sou abordado pela gerente do spa do hotel, oferecendo-me a cortesia de um banho de ofurô, provável tentativa esforçadinha de acalmar o sarcasmo que ilustrava cada um dos meus encontros com o gerente. Achei que era, enfim, um gesto simpático e combinei o horário. Cavalheiro que sou, ofereci o mimo à minha expensive half, mas ela já estava se divertindo com a investigação da morte do besouro (que lá continuava...) e recusou.
Então, no horário combinado, lá estava eu, com minha masculinidade posta à prova, sendo recebido por um tapete de pétalas de rosas que levava ao ofurô. Logo eu, que sou carinhosamente chamado de Ogro, dada minha delicadeza. Entro na banheira que, de tão quente, quase produz ovos cozidos. Abro a água fria e depois de uns 10 minutos, finalmente, consigo relaxar. E depois da pseudo-feijoada eu realmente parecia o Shrek da abertura do segundo filme, na banheira com a Fiona.
Depois, quase letárgico, volto para o meu quarto para um banho de chuveiro. Na porta, sou recebido pelo besouro, ainda na cena do crime. E ao entrar no quarto, a notícia de que não havia água quente no chuveiro. Adeus efeito relaxante do ofurô. Consulto a recepção e sou informado de um problema na caldeira, com previsão de 10 minutos para solução. Não me iludo, mas espero. Depois de meia hora, tomo banho a uma temperatura ligeiramente superior à ambiente. Fazia 12 graus.
Na hora de jantar, passo pela recepção e agradeço ao gerente por ter-me feito rejuvenescer 25 anos. Efeito do ofurô? Não. É que desde o serviço militar, aos 18 anos, não tomava banho gelado daquele jeito.
Estava decidido a me divertir com a situação e depois do jantar curtimos muito a festinha julina organizada ao ar livre, com um show de pirofagia bem bacana dos nossos amigos circenses, até a hora de dormir, desta vez devidamente embalado pelo silêncio da noite interiorana.
Mas ainda não é o fim de nossa saga. Nem da do besouro.






terça-feira, 13 de julho de 2010

Férias com Crianças [Episódio I: Expectativa]

Julho.
Férias.
Das professoras.

Para os pais é uma delícia ter as crianças em casa sem a rotina para-militar de horários e atividades encadeadas, mas também é um baita exercício de criatividade manter um consumo constante de energia saudável.

Sei que existe o caminho curto das babás eletrônicas. É só liberar o acesso aos vídeo-games, computadores e DVDs para que o dia passe na maior tranqüilidade. Mas acho que as crianças merecem mais, ainda que uma programação de férias clássica seja algo especialmente complicado para empresários e profissionais liberais.

Mas sempre dou um jeito e desta vez, em consenso familiar, decidimos ir para o campo. Começa o processo de escolha da cidade e do hotel.

Tinha uma referência positiva, de amigos que moram e trabalham na região e, dentre os vários pesquisados nas cidades próximas, este parecia ser particularmente interessante, pacato, gostoso.

No Guia 4 Rodas, as 3 casinhas em vermelho também avalizavam a escolha.

O site é bonitinho e tem referências apetitosas à gastronomia e um enfoque especial às atividades recreativas para as férias de julho. O ponto mais memorável era, sem dúvida, a recreação infantil com atividades circenses.

Depois, a festa julina, a suculenta feijoada completa no almoço do sábado e o almoço italiano com música ao vivo no domingo. Sim, soa provinciano. Mas quem não gosta?

Consenso familiar atingido, vamos fazer a reseva. Ao telefone, nada de gravações ou vozes sintetizadas. Uma moça simpática e com nome atende e é toda solícita ao esclarecer todas as dúvidas. Informa que só tem um apartamento disponível na “Ala Golden”, que é uma construção mais nova, a menos de 50m do prédio principal. Não vejo problema e confirmo a reserva para quatro dias, o que durante as férias de julho, fica longe de ser uma pechincha.

Mas não é um problema. Só pensei no quanto as crianças se divertiriam com os recreadores nas tais atividades circenses. Normalmente elas já se divertem muito com os monitores nos hotéis. Além de gás e repertório inesgotáveis, entrosam 20 ou 30 crianças magicamente, melhor e mais rápido que qualquer professora primária. E o apelo do circo só ajuda. Lulu já é praticnte de ginástica olímpica, plenamente familiarizada com saltos, alongamentos e macaquices diversas. E Lala ainda não tem a mesma desenvoltura, mas enlouquece de ver as acrobacias da irmã e tentar imitá-la. Com um bom professor, certamente aprenderia muita coisa bacana para exibir no primeiro dia de aula, enquanto não tem idade para as aulas de ginástica artística.

Enforco e sepulto a quinta-feira e nos mandamos. Pouco mais de uma hora de estrada e chegamos a Jarinu, que com a vizinha Atibaia divide o trono do morango no circuito das frutas do interior paulista.

A área do hotel é realmente muito bonita. A construção principal é de gosto duvidoso, mas bem conservada e limpa. Da entrada, vejo os banners de duas firmas que tinham eventos acontecendo ali.

No check-in, um simpático mensageiro descarrega minha bagagem, enquanto preencho aquela famigerada e misteriosa fichinha. Deixei de fazer reservas online quando percebi a inutilidade de prestar tantas informações através do site, se quando chego a QUALQUER hotel tupiniquim preciso preencher a tal da fichinha, com o auxílio luxuoso da esferográfica.

Fichado, recebo os cartões magnéticos que fazem as vezes de chaves e sou informado de que o mensageiro (com a bagagem à porta do elevador) nos acompanhará ao nosso quarto, no terceiro andar. Penso ter sido recebido a primeira de uma série de gentilezas inesperadas. Vagou um quarto no prédio principal e eles gentilmente providenciaram a mudança, para nossa maior conveniência.

Nada disso. Era apenas uma recepcionista nova e despreparada, pensando que todos os apartamentos iniciados com “3” ficavam no terceiro andar.

Minha frustração não foi nada demais. Pior foi para o mensageiro que teve que pegar toda a bagagem (que incluía o guarda-roupa de inverno de 3 mulheres) novamente e colocar no carrinho elétrico que nos levaria à “Ala Golden”.

Achei curiosa a existência de um transporte tão elaborado para integrar ambientes distantes apenas 50m, mas pensei na bagagem, idosos, deficientes... ficou fácil compreender.

Subimos um lance de escada e rumamos ao final do corredor. Quase na porta do que seria meu apartamento, um besouro jazia de pernas pra cima, praticamente invisível sobre o granito preto do piso. Coisas de um cenário bucólico.

O mensageiro abre a porta do amplo e arejado apartamento, com duas espaçosas camas de casal. Entro e sinto um cheiro familiar. Lembrei vagamente de um pequinês que tive na infância e resistia a banhos freqüentes. Mas, janela aberta, a lembrança se desfaz rapidamente, assim como o cheiro.

Malas largadas no quarto, vamos dar uma volta pela área bacanuda do hotel.

Quadras de tênis, vôlei de areia, campo de futebol, mini-golf, lago, spa, academia, piscinas ao ar livre e uma outra interna, aquecida, junto às saunas.

As várias salas de convenções mantém o hotel movimentado quando não há férias ou feriados.
De volta à sede, bate uma fominha. Paro no bar do hotel e peço um queijo quente, que é sempre uma opção segura. Bem... Era, até o bartender me perguntar "O que vai no queijo quente?"

Parei por uns segundos, esperando por uma piadinha, que não veio. Então respondi placidamente que era queijo, dentro do pão, na chapa. E esperei de novo por uma gracinha que, de novo, não aconteceu. Ele tomou nota e seguiu para a cozinha, de onde voltou em 5 minutos, com o lanche pronto.

Na sequência, conhecemos os monitores de plantão. Duas figuraças que se apresentaram como Batatinha & Espeto, não à toa. Empatia imediata com minhas exigentes petizes, que só pararam a bagunça para o banho e já voltaram correndo para jantar com os “tios”. E brincaram até a hora de ir dormir.

Ah... a hora de dormir! Tão aguardado momento.

Afundo no colchão um pouco mais do que esperava. Tenho vasta experimentação em hotéis de todos os tipos, em todos os lugares e sei que qualquer coisa diferente da própria cama acaba causando alguma estranheza. Deixo de implicância com o colchão e o travesseiro e sinto a proximidade de Morpheu (não, nada a ver com Matrix). Mas Morpheu é afastado por um barulho de vozes se aproximando e se avolumando.

O povo de uma das firmas em convenção se aproximava, vindo do bar do hotel para a minha “Ala Golden”. Normal, pensei. O povo tomou umas a mais, fala um pouco mais alto, mas logo vai dormir.

Meia-hora depois, o barulho só piora. Minhas 3 mujeres já tinham dormido há muito tempo e nem tomaram conhecimento. Mas eu liguei para a recepção e pedi a interferência de uma autoridade administrativa pra por ordem no barraco. E nada acontece. Acabo dormindo, cansado. Mas essa ausência de ação levantou a minha antena de uma forma não muito boa...

Levantei na sexta-feira com dor no pescoço, a pulga atrás da orelha e o besouro morto ainda na minha porta.

No próximo episódio, novas e eletrizantes aventuras!

:D